BRASILEIROS NO FRONT

Pracinhas da Segunda Guerra inspiram filme coproduzido por Brasil, Itália e Portugal

Cristina Romanelli

Uma tropa brasileira que combatia na Itália durante a Segunda Guerra Mundial sofreu um ataque de pânico. Assustados e perdidos, os soldados correram para todos os lados. Quatro deles conseguiram se reunir e acabaram encontrando um alemão. Surpreso, ele falou: “Não sabia que a Alemanha estava em guerra com o Brasil!”. Nem ele, nem muita gente. A cena faz parte do filme “A Montanha”, de Vicente Ferraz, que deve estrear em outubro no Festival do Rio, mas bem que poderia ser real. Até hoje a participação brasileira no front é pouco conhecida fora do país.

A coprodução de Brasil, Itália e Portugal é uma ficção baseada em relatos dos pracinhas, e pretende divulgar aqui e lá fora a participação deles na guerra. “Os outros países mal fazem ideia da ida dos pracinhas. Não há muitas publicações, e nenhum filme sobre o tema. Nossa atuação foi pequena. A contribuição maior foi o envio de suprimentos e a construção de bases norte-americanas no Nordeste”, diz Luis Felipe da Silva Neves, historiador da Universidade Federal Fluminense.

Na época, o país vivia sob a ditadura de Getulio Vargas. A própria população pediu que se declarasse guerra em 1942, depois que os alemães afundaram vários navios na costa brasileira. “Queriam declarar guerra, mas não necessariamente que brasileiros morressem lá. Getulio tinha interesse nisso, para desviar a atenção para longe dos problemas da ditadura. Ele também queria ficar em paz com os militares e passar a Argentina como liderança na América Latina”, explica Neves.

Em 1944, mais de 25 mil soldados da Força Expedicionária Brasileira (FEB) foram enviados para lutar no rigoroso inverno italiano. A farda pouco ajudava a aquecer, e a inexperiência dos pracinhas fez com que aprendessem a lutar na marra. Segundo Neves, o processo de seleção dos combatentes foi malfeito. “A maioria foi convocada porque se candidatou. Tinha desde gente que falava francês e inglês até gente que nem tinha todos os dentes na boca. Mas foi uma experiência traumática para todos eles. A guerra desnuda as pessoas”, diz o historiador.

A ideia de “A Montanha” é justamente mostrar o aspecto humano da guerra, do ponto de vista de quatro soldados brasileiros, um alemão e um italiano. “Não é tanto uma história política; é mais uma história humana. Reconheço no roteiro vários sentimentos e situações que ouvi dos pracinhas ou que li nos diários durante a pesquisa. Coragem extrema, medo, certeza, incerteza”, diz Carla Siqueira, uma das historiadoras da produção.

A história se passa no Monte Castelo, mesmo local onde a FEB teve suas maiores baixas. O cineasta Vicente Ferraz, que também dirigiu o documentário “Soy Cuba, o Mamute Siberiano” (2005), deve terminar as filmagens na Itália este mês. “Parte da equipe já tinha ido à Europa conversar com sobreviventes da guerra. Eles eram crianças e cresceram com o imaginário do convívio com os soldados”, conta a produtora Isabel Martinez. Apesar de não seguir o perfil dos demais filmes sobre a guerra, “A Montanha” tem ao menos um ponto em comum com um deles, a participação do ator Richard Sammel, que já havia interpretado um soldado alemão em “Bastardos Inglórios” (2009), de Quentin Tarantino.

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